Manga Chupada


Manga Chupada, escrito, dirigido e produzido por Diogo Berni, Brasil/2018. Sei que soa suspeito em formular uma crônica/ crítica acerca minha própria obra fílmica, todavia não tive como negar o pedido de uma pessoa tão querida, que abriu espaço em seu site para um jovem apaixonado por filmes, começar a traçar suas primeiras linhas sobre o que é apaixonado: a sétima arte. Seria uma baita ingratidão se começasse a falar com ele sobre conflitos éticos de realizador e jornalista e então, deste modo, aceitei o desafio. O projeto do filme Manga Chupada surgira de um conto, aliás, de dois contos : o primeiro feito em 2007, quando morava em São Paulo, e o segundo já de volta à Salvador em 2014
. Neste hiato de sete anos continuei em minha profissão como crítico de cinema, esta estendendo-se até ano passado, e com sérias afirmações de que estou voltando ao ofício, basta para isso, que algum festival de cinema me convoque, pois são nos festivais, vivendo sete ou oito dias de cinema ininterruptos que as percepções sobre a vida de uma maneira geral, não só dos filmes, surgem e acabando fluindo em textos cinematográficos. Porém voltando a falar do meu filme, tenho que fazer ainda algumas ressalvas; primeiro: não tinha a menor idéia de que iria ser diretor e roteirista alguma vez na vida: estava feliz como crítico de cinema, mas eis que de repente surgiu um convite para fazer a película oriunda dos meus contos: claro que topei na hora e foi uma das mais sábias decisões que tomei na vida. Embora tivéssemos contos, mas estes teriam que se transformar na bendita linguagem cinematográfica com o roteiro. Como não sabia a forma de fazer um roteiro tive que fazê-lo sob a ajuda do diretor de fotografia do filme, e pasmem: fizemos o roteiro em um mês intenso e via Gmail, isso mesmo. O Gleidson Alves dava um pitaco e eu, outro, e daí nasceu o roteiro : pela internet ! As gravações ocorreram em dois dias: uma na praia e outra no mato, mas vamos ao que interessa que é a estória do filme. Pois bem, antes de qualquer coisa é preciso explicar o nome do filme. Manga Chupada fora a minha primeira prancha de quilhas, quando tinha por lá dos treze anos de idade, fazendo a transição do Body Boarder ( ou morry bug ) para uma prancha de bico. A mudança, para minha tenra idade, era atípica e perigosa porque as quilhas e o bico frequentemente feriam, às vezes seriamente alguns dos praticantes conhecidos meus e mais experientes. Como estava com uma frenética vontade de me arriscar a furar minha cabeça com o bico, aceitei a primeira prancha que me deram de presente, quando perceberam aquele pré-adolescente agitado. A prancha era tão chupada do sol que um dia um amigo meu da minha idade, que ainda surfava com o “Morry Bug”, viu o calhau e cravou rindo : “Porra Diogão , essa sua prancha parece uma manga chupada, será que vai afundar quando você subir nela?” . O filme em si conta um dia de surf de dois amigos pré-adolescentes sentindo os sabores e os dissabores em mudar de uma faixa etária para outra, ou seja, em transformassem em homens ou homenzinhos. Com atores da mesma faixa etária o filme enreda as responsabilidades e desafios dessa transição de idades, e principalmente de mentalidades. Na verdade o que quis fazer fora um retrato alternativo do que pode vir a ser a cabeça de um garoto de treze anos de idade, e este mesmo garoto,por conseguinte, contestando a todos os valores sociais e morais que o impõem até então. Por exemplo: será que o modelo de um colégio é de fato eficaz ao ensinar somente o que vai cair no vestibular ou nos prepararmos para aquelas perguntas retrogradas e ineficientes em uma entrevista de trabalho, será que os valores que temos que aprender para “se dar bem na vida” se limitam em você ser mecanicamente eficiente para consequentemente passar em uma entrevista de emprego ou em uma universidade pública, sendo que seus pais teriam dinheiro para custear uma particular, tomando a vaga, inclusive, de alguém que não teria esse apetite financeiro paterno, materno ou ambos? ( sou a favor de 100% de cotas para pobres em universidade públicas ) Enfim, o garoto indo surfar começa a se indagar de que tudo que ele ,até então, tinha aprendido na vida como correto seria uma tremenda falsidade ou disfarçada injustiça. Com essa angústia no peito ele pega a sua namoradinha Manga Chupada e começa a remar inconsequentemente até furar a rebentação de um dia de mar agitado, assim como queria furar os valores sociais pré-estabelecidos que já atrapalhava seu início de vida. Outro aspecto a se destacar da obra fílmica é o elo de amizade que o surfista tem com seu outro amigo; nos diálogos aparecem suas dúvidas em relação ao futuro dos garotos de classe média, e se “ser “ extremamente radical seria a melhor das saídas. Entretanto de uma coisa os dois concordavam: morriam de medo de se transformarem em adultos idiotas e superficiais que só pensam em dinheiro, sabedores que as melhores coisas da vida são grátis, como uma boa onda surfada ou um bom “couro” que se dá em uma gatinha, maluquinha igual a eles.

O objetivo do filme é instigar pessoas, e não importa suas idades, porque nunca é tarde pra mudar ( antes tarde do que nunca, como já diz o ditado ) a sua maneira de pensar e agir diante de situações com pessoas e instituições. Manda quem pode e obedece quem tem juízo, mas se perguntarmos o que é juízo, quem o fez e para quem o fez? A resposta é demasiada complexa pelo fato do “juízo” ser arbitrário, ou seja, o que é correto para alguns pode, e na maioria imensa das vezes é, prejudicial a muitos outros. O que quero explicitar é que o epoder de alguns sempre desbenefeciará a outros; assim é a lei natural da vida humana desde o tempo das cavernas ( enquanto uns dormiam outros iam caçar, mas poderia acontecer que este que ficou dormindo, estivesse com mais energia em comparação ao outro cansado de caçar e quando o chegasse com a caça na caverna o dorminhoco audaz surrupiasse a caça e comesse sozinho, enfim é a lei do mais forte e acima de tudo, do mais adaptado a ser esperto ) . No filme fiz questão de mostrar, logo no seu inicio, a imagem de duas mangas chupadas, fazendo uma analogia entre a situação do homem para com a sociedade e com seus pares, dando a ideia de que poderemos ser chupados, como aquelas mangas, se não formos audazes e espertos o suficiente para enganar o jogo social, ou seja, respeitar o modos-operantis do jogo social, mas sempre desconfiar dele, afinal a pergunta que não quer calar, e que ficou escancarada no filme é: Quem fez as normas, quem ganhará e perderá com elas, são justas, existe "justiça", obedece a premissas humanas básicas? É bom viver, mas melhor ainda é saber viver. Deixarei o link do filme abaixo, caso tenham curiosidade.

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