Jardim das folhas sagradas

Jardim das folhas sagradas, de Pola Ribeiro (2011 - Bahia), é um belo filme. Este que aborda valores como preconceitos: racial, intolerância religiosa, homossexual, bissexual e ainda o diretor expande a sua instigante película na mobilidade urbana que acontece na capital baiana e outras metrópoles nos dias atuais. Porém abordaremos a película como um todo e discutiremos esses vulgos problemas ou temas citados acima no decorrer da crítica. O filme se baseia na estória de um negro ou aos que preferirem afro-descendente chamado Bonfim. Sobre este, é um bancário bissexual casado com uma fervorosa evangélica que tem como obcecação a evangelização do seu marido. Enquanto a pressão em sua casa começa a se tornar insuportável, Bonfim embarca em um caso extraconjugal apaixonante com um colega de trabalho. As coisas começam a piorar para o Bonfim quando acontece um trágico acidente automobilístico onde era o próprio protagonista que dirigia o carro, vitimando o seu namorado em uma viagem em que estavam fazendo. Acidente este acontecido pelo fato de o motorista, “passar” a ter visões de uma negra toda pintada andando nua pela estrada. Esse foi pior momento do protagonista: perder o seu grande amor em seus braços sem poder fazer nada com sangue para tudo que é lado, e ao mesmo tempo perceber que aquela visão que tivera não fora uma simples alucinação, mas sim um chamado, ou para ser mais específico, um ultimato que os Orixás estavam lhe dando para cumprir sua missão de ser Pai-de-santo. Depois dessa “mensagem”, Bonfim acorda e coloca a “mão na massa” a fim de inaugurar um terreiro de candomblé. Quando escrevo inaugurar, leia-se comprar um lugar para tal finalidade. Desta forma então adentramos em um dos principais problemas abordados no inicio dessa crítica, porém não o principal, pois a este abordaremos mais adiante, que é a própria religião do candomblé. Porém a este primeiro imbróglio secundário citado, simplesmente é nada mais nada menos do que a especulação imobiliária, onde na estória da película mostra-se com bastantes falsos vendedores de terrenos e muita procura para estes, ocasionando assim um exorbitante nível de oferta e conseqüentemente os preços dos terrenos a se alavancarem mais do que as montanhas de Maomé em tempos bíblicos, coisa não muito diferente da nossa realidade. Acredito que foi a intenção do diretor com essa questão em especial: analisar o filme com os seus problemas sociais e econômicos e transpor para o hoje tentando entendê-los. Voltando ao enredo da película, apesar de todo perrengue em comprar um local para fazer seu terreiro, Bonfim depois de pesquisas e ainda assim enganado consegue fazer a sua “Igreja Afro”, que de certo modo faz o se sentir mais aliviado com a sua vida agora fazendo sentido, cumprindo a missão de ajudar aos outros com o dom em que os orixás te incubiram e ele teimosadamente durante décadas insistia em ignorar trabalhando em um banco que o descriminava pela sua cor de pele e onde realmente não tinha nada a ver com a sua pessoa. A película é envolvente do inicio ao fim, com ritmo e temas que até nos dias de hoje, por incrível que pareça são tabus como os preconceitos religiosos e de opções sexuais. A questão da mobilidade urbana e do transporte público foi debatida inteligentemente pelo diretor com uma Salvador moderna, e conseqüentemente por esses fatores evoluindo a auto-estima da população com acesso a maior renda per - capita, educação as pessoas de menor renda, transporte digno para bairros de periferias e mais longínquos dos centros econômicos e comerciais da cidade, a segurança pública sendo efetiva para a população de todas as classes sociais e os acessos a cultura e a arte ampliadas. Por finalizar a crítica sinto-me na responsabilidade em ressaltar o presente que esse filme deu a cultura afro-brasileira e por conseqüência a cidade de Salvador, que é o local onde se tem mais negros fora do continente africano. A partir dessa bem feita película a raça negra valorize ainda mais a sua religião e cultura, e quando algum funcionário do IGBE perguntar de que cor ele (a) é: essa pessoa possa falar com orgulho que é negro (a), e não parda ou mestiça com o intuito de assumirem orgulhosamente a sua cor e conscientes de uma ancestralidade e cultura riquíssima, galgando assim, com essa consciência que de fato ser negro ou afro-brasileiro é uma dádiva, por seguinte consigam a merecida ascensão social e o reconhecimento profissional, o que ainda é para a minoria, podendo ter moradias dignas, com investimento na educação dos seus filhos para transformarem-se futuramente em profissionais competentes com salários iguais ou maiores do que os brancos, afinal somos todos iguais e os direitos têm de ser também. A carência que o cinema brasileiro tinha em produzir filmes que abordava a cultura afro-brasileira foi sabia e sagazmente preenchida com Jardim das folhas sagradas. Finalizo a crítica com um fato histórico: a coincidência entre o filme comentado em relação com o Barravento, que foi o primeiro longa-metragem da Bahia, mas precisamente rodado na praia de Buraquinho, dirigido por Glauber Rocha, o criador do cinema novo na década de 1950, que por forças do destino ou vontade própria levantava a bandeira do Candomblé e das raízes afro-brasileiras. Presságios que novos tempos estão em ebulição no cinema baiano e brasileiro.

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