Tropikaos

Tropikaos, dirigido, co-montado e roteirizado por Daniel Lisboa, 2018, Brasil. Tem um ditado que diz que todo filme ou livro publicado é uma espécie de auto bibliografia. Acho que no primeiro, não tem muito como fugir desse clichê, pois lá está toda a ansiedade que o autor pensou há anos em fazer. Tropikaos é meio isto, uma espécie de regurgitação do Daniel Lisboa; um leque exposto das suas experiências vividas ou seus pensamentos. O protagonista, como não poderia ser diferente, é uma espécie de alter-ego do diretor soteropolitano. Trata-se de um poeta: O Guima, uma abreviação de Guilherme, mas Guima para o mundo artístico. O vosso poeta, vosso porque seu maior inspirador é Castro Alves, anda meio empacado com seu livro; não consegue continuar escrevendo pelo excessivo calor do verão de Salvador, o maior de todos os tempos. O livro é patrocinado pelo governo do estado e por isso a Secretária da Cultura pede pressa para que Guima acabe de escrever seu livro de poemas para o lançamento na inauguração do carnaval daquele ano, mas só que para Guima a tarefa não é tão fácil assim. Primeiro porque os poetas necessitam de inspiração para escrever, então o pior martírio deles são prazos a serem cumpridos; para inspirar-se Guima fuma crack, mas isso pouco ajuda no processo da escrita. Além desta necessidade poética de inspiração, ou talvez por isto, Guima começa a queimar-se por dentro; uma espécie de alta sensibilidade aos raios UV, ao qual ele chama de ultraviolência solar. O poeta vai aos médicos, mas estes por sua vez são incompetentes em diagnosticar seu mal-estar. Em certa cena o protagonista afirma que não fora preparado geneticamente para viver em uma cidade quente como Salvador. Por tal motivo enjaula-se em seu quarto, com um ar-condicionado Eletrolux modelo 1992 na potência máxima, esperando a tal inspiração para acabar seu livro de poesias. O arco dramático do filme surge quando seu ar-condicionado quebra e Guima se vê completamente perdido em pleno verão ultra escaldante soteropolitano, como o nosso último: o pior dos últimos vinte e dois anos. O ar-condicionado, além de livrar o poeta do calor, era também um tipo de amuleto misturado com melhor amigo do poeta, e quando este quebra Guima se desmiola, ou se perde, também. No affair de consertar o aparelho o protagonista conhece o personagem mais interessante da trama: Um senhor meio barrigudo que conserta seu ar após ouvir uma entrevista do poeta pelo rádio, e vendo e acompanhando o drama que aquele poeta estava passando. O filme percorreu festivais de cinema como os de São Paulo, Rio, Tiradentes e Salvador com salas lotadas e foi bem recebido pela crítica. Daniel Lisboa é talvez a única aposta baiana atual de um cinema honesto e transcendental; não à toa tem como padrinhos o cineasta Edgar Navarro e o eterno “Super-Outro” Bertrand Duarte. Agora não precisamos mais aguardar pela estreia comercial do filme, e muitos, assim como eu, ficarão identificados com os locais e personas do filme, que são figuras presentes na cena notívaga do boêmio bairro do Rio Vermelho, em Salvador. A obra entrou em cartaz nesta última quinta feira, dia 05 de abril, exclusivamente no Cine Itaú - Glauber Rocha, no centro de Salvador, e certamente vale a conferida deste filme cem por cento rodado e produzido na capital baiana.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Livros do Joca

Pirataria X Streaming

Cangaço Novo