Gestão de crise e reputação empresarial

 

No filme, uma explosão numa plataforma de petróleo de uma grande petrolífera norte-americana no golfo do México causa a maior tragédia ambiental dos EUA: Cerca de 20 milhões de galões de petróleo foram vazados e 11 pessoas ficaram desaparecidas. Após isso, uma série de acontecimentos se desenvolvem em torno da figura particular e pública do congressista Collins, interpretado pelo ator Nicolas Cage. O derramamento do petróleo, considerada uma crise repentina causada por desastre natural, parece ser o maior problema a ser enfrentado pelo protagonista como um político responsável. Porém, em meio a situação de calamidade pública, ocorre também uma superexposição na mídia de um vídeo gravado num hotel onde Collins manteve um relacionamento extraconjugal. Situação esta que dá origem a principal crise envolvendo o protagonista, sendo dessa vez, uma crise de reputação. Para além da exposição de uma postura infiel, que abala a confiança na ética do político, a situação é agravada pelo fato da mulher envolvida ser casada com um pescador que sofre diretamente as consequências da tragédia. É nesta conjuntura que Collins se vê numa crise que afeta tragicamente suas intenções políticas em candidatar-se à uma vaga ao senado.

A partir deste cenário, surgem diversos agentes que potencializam a crise reputacional e pessoal de Collins até o limite. Sua esposa confunde interesses privados com lobistas para tentar influenciar nas decisões do marido. Seu pai, ex-prefeito de prestígio na cidade, sofre de alcoolismo e aparece como um símbolo de frustração da sua carreira até a sua morte, que ocorre em meio a todo o processo. Sua assessora de imprensa, presente durante toda a trama, o aconselha em diversos momentos para tentar conter a crise, entretanto, pede demissão do cargo e se envolve com o protagonista, que se alimenta da ilusão de uma nova paixão. 

A trajetória de sua carreira política, que estava em ascensão após declaração firme e emocionante proferida na câmara nacional sobre a calamidade pública decorrente do derramamento do petróleo, sofre uma brusca ruptura de reputação com o vazamento de vídeo íntimo que força o congressista a renunciar. Porém, demonstrando o ímpeto dos grandes políticos, Collins assume o seu compromisso inicial e se empenha em ajudar as pessoas mais afetadas com a tragédia através de trabalho social e apoio jurídico às vítimas. Este trabalho o aproxima ainda mais das vítimas da tragédia, que num segundo momento se tornam influenciadores e eleitores na retomada da sua carreira política. Aqui se percebe a mudança de percepção do público sobre a personalidade política através do vínculo emocional. A comunidade passa a perceber os valores de empatia, cidadania e liderança em Collins. É possível perceber neste momento da trama, a metodologia RepTrack aplicada, uma vez que a integridade demonstrada por Collins em trabalho voluntário e cidadão para conter a crise ambiental restabeleceu a confiança da comunidade local que, naturalmente, converteu em admiração coletiva e, consequentemente, uma reputação positiva.

Collins procurou manter vivas suas aspirações políticas, ou o que restou delas, decidindo reabrir espaço para a relação com um lobista que o havia seduzido no início da trama, revelando um contra-senso em seu posicionamento. Pode-se considerar também que este contra senso influenciou na decisão da sua assessora em desistir do relacionamento após saber da sua reunião que insinuava uma retomada das suas pretensões políticas. Somado a isso, os abalos em sua vida particular o conduzem novamente a encontrar o fantasma do alcoolismo, que no passado causou enormes danos a sua reputação. É neste momento que acontece a virada na história do protagonista, que passa a novamente contar com a ajuda da esposa. O Instituto mantido pela família Collins, que buscava fundos para a campanha de apoio social, recebe uma doação robusta da petrolífera responsável pela tragédia ambiental. Nesse sentido, é importante pontuar que a aliança política com a petrolífera poderia representar mais um fator de risco à reputação do congressista, uma vez que representa um contrassenso a postura inicial de Collins. Além disso, a falta de transparência no processo de doação ao Instituto e ao futuro financiamento da campanha para o Senado, poderiam representar mais uma desconfiança do público na ética do político. No entanto, na narrativa ficcional de The Runner (ou "Fator de Risco", intitulado em português), essa situação não foi explorada - e nem prevista pela equipe do protagonista.

O clímax da trama se dá quando, abalado pela conjuntura de crise, Collins se afunda no alcoolismo e provoca um acidente ao colidir seu automóvel. Passado este momento, o protagonista retoma seu casamento com sua influente esposa e reconsidera a oportunidade de voltar à cena política. Collins utiliza toda a exposição e reconstrução positiva da sua reputação durante a crise causada pelo vazamento de petróleo, reúne o poder de influência da esposa e os interesses do lobista para lançar sua campanha como Senador.

A estratégia de campanha eleitoral eficaz faz com que a situação reativa de enfrentamento e acusação contra grandes conglomerados da indústria do petróleo se transforme num discurso conciliador de coexistência pacífica em prol dos empregos e do bem estar social. Em momento oportuno o tempo se mostra o maior aliado , e a “mancha” do escândalo sexual é esquecida pela opinião pública e numa reviravolta espetacular Collins se elege senador.

Sendo assim, é possível afirmar que o filme retrata altos e baixos de um processo de gestão de crise. A falta de planejamento prévio, cuidado com a imagem do congressista e choques de interesses políticos revelam uma fragilidade quando o assunto é reputação. Por outro lado, o que se observa é que houve uma atenção do protagonista em perceber, dentro da crise, quais seriam as oportunidades para sua carreira enquanto político. A verossimilhança é facilmente percebida quando os tabloides geram uma superexposição de casos que colocam em xeque a confiabilidade (como o vazamento de vídeos íntimos) e, meses depois, o fato é esquecido pelo público - dada a quantidade de informação sobre crises reputacionais envolvendo políticos. ( Feito a seis mãos: Tico Marcos, Ivie Leone e Diogo Berni para a Pós Graduação de Gestão Estratégica pela UFBA ).